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| Alceu Pólvora |
CANDINHA DÓREA
(atriz)
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| Nahud e Candinha |
Certa vez, aproveitando um pequeno intervalo do trabalho para relaxar no auditório do Centro de Cultura Adonias Filho (CCAF), no mais absoluto silêncio, fui tomado pela magia da ribalta. No palco, o cenário de “Corpo & Cordel” representava a paisagem onde os sonhos habitam sem constrangimento e os atores se iluminam como deuses. Então, subitamente, revi o sorriso da saudosa Candinha Dórea. Um sorriso de uma candura enternecedora. Retrato de uma época, Maria Cândida Pereira Dórea é considerada a primeira dama da história do teatro itabunense. Como não sou chegado à títulos, prefiro recordá-la como uma senhora apaixonante, de vida intimamente ligada à arte, destacando-se no teatro dos anos 60. Sempre elegante, ela esteve na inauguração de uma das minhas risíveis exposições de pintura, “Destroços da Realidade”, em 1988, e no lançamento do meu primeiro livro, “O Aprendiz do Amor”, em 1993. Mesmo longe de Itabuna, quando passava por lá dava um jeito de visitá-la no CCAF – e também Carmem Modesto, duas amigas queridas. Atriz desde os sete anos, quando subiu ao palco pela primeira vez, Candinha disse-me no final dos anos 80 que pensava em voltar à atuar na pele da Amanda Wingfield de “À Margem da Vida”, de Tennessee Williams. Infelizmente, não concretizou o sonho. Em 2005, ela partiu para o outro lado da lua, aos 95 anos. Nós sabemos o que perdemos. Deixou uma lacuna que talvez nunca seja preenchida, pois artistas humanistas de sua envergadura não se fabricam mais e dificilmente terão alguma chance de vingar no pântano atual do individualismo e da maledicência. Hoje, em sua homenagem, assisti ao filme “À Margem da Vida”, imaginando como ela ficaria feliz apreciando a grande Gertrude Lawrence dando vida ao seu personagem predileto. Aleluia, Candinha! Saudades, amiga do peito!
EVA LIMA
(atriz e produtora cultural)
O teatro sobrevive no território da emoção. Atraído desde sempre por esse universo libertário, tornei-me amigo de atrizes (Meran Vargens, Andrea Elia, Alba Cristina, Ritinha Santana, Hebe Alves etc.), escrevendo peças para algumas elas. Lembro-me de “Das Sombras”, para Daniela Escobar; “Águas, Luas Doidas”, para Eva Lima; “Sonhos que Mentem”, para Rita Assemany; e “Duas Mulheres Bem Comportadas”, para Cláudia Magalhães. O texto que fiz para a espevitada Eva se perdeu ao longo do tempo. Uma pena, porque tinha o seu encanto. Recordo-o com nostalgia, embora não tenha capacidade para reescrevê-lo. Contava a história da governanta do escritor francês Marcel Proust, então nos seus últimos dias de vida. Também não existe cópia, que eu saiba, de um vídeo-poema que dirigi para a TV Cabrália com Eva como protagonista, versos de Cyro de Mattos e música de Erick Satie. A trajetória artística dessa expressiva atriz começou na primeira metade da década de 80, ou seja, há 30 anos. Projetou-se como uma das referências do teatro grapiúna. Entre o sonho de artista e a difícil arte da sobrevivência, ela atuou em “Transe”, “Itabuna Alves do Amor Divino”, “A Feira”, “Dona Flor e seus Dois Maridos” etc. Como a prostituta Ana de Amsterdã de “Calabar – Elogio da Traição”, de Ruy Guerra e Chico Buarque de Holanda, na Sala Zélia Lessa, primou pela precisão, pela sensibilidade exata. Depois de uma temporada fértil em Salvador, participando inclusive de filmes (a sua cena em “Eu Me Lembro”, de Edgard Navarro, é inesquecível), voltou a terrinha, virando a cidade de cabeça pra baixo como valorosa produtora cultural. Tenho certeza de que a arte transforma mentes e corações. A arte existe, justamente, para ser uma manifestação diferenciada do corriqueiro, do comum, do demasiado humano e real. Através de metáforas, alegorias e recursos estilísticos, o milenar teatro existe pela perseverança de gente talentosa como minha querida amiga Eva Lima. Bravo, Evita!
SONIA COUTINHO
(escritora e dramaturga)
Cá entre nós, não nego o meu fascínio pela literatura da itabunense Sonia Coutinho. Ainda estudante, ao bater com os olhos pela primeira vez em suas palavras, nunca mais deixei de admirá-las. A obra em questão, “O Jogo de Ifá”, de 1980, faz referências a deusas e divindades do universo afro-brasileiro. Sonia pertence a frutífera geração de Hélio Pólvora, Florisvaldo Mattos, Cyro de Mattos e Telmo Padilha. O que é compreensível, considerando-se que na sua época de formação o livro ainda tinha leitores e importância. Com ênfase no imaginário e no psicológico, suas protagonistas são mulheres independentes, aventureiras, artistas, jornalistas e intelectuais. Radicada no Rio de Janeiro, a contista e romancista (também jornalista e tradutora) se dedica a prosa que traduz o fluxo de consciência, como na antologia de contos “Os Venenos de Lucrécia”. Premiada duas vezes com o Jabuti da ABL, recebeu em 1994 o título de Mestre em Teoria da Comunicação com a tese-ensaio “Rainha do Crime — Ótica Feminina no Romance Policial”. Em 2008, adaptei um dos seus contos para o teatro, “Na Penumbra com a Deusa Loura”, direção de Matheus Saron. Foi a aproximação mais íntima que tive com a autora. Nunca cheguei a conhecê-la pessoalmente. Decepcionada, ela não pisa os pés em Itabuna. Compreendo perfeitamente. Um dia possivelmente farei a mesma coisa.




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