OBRAS DO AUTOR








CRÔNICA -                    Como tudo começou

A alguns anos, fui convidado pelo Produtor de cinema Elson Rosário, para fazer uma viagem como motorista para uma produção do Cineasta português Manoel de Oliveira, para o filme "Palavra e Utopia". Pensei que na minha volta após receber o pagamento pela viagem até Banzaê, numa reserva indígena dos índios Kirirís, estaria acabado a minha história de produção, e eu voltaria a minha vida normal de gente normal. Salvo engano, uma semana depois fui chamado pelo mesmo produtor para uma segunda viagem, agora de segurança da produtora Débora Macedo que iria buscar 50 índios para realizarem cenas do filme em Salvador.
Às 4:30 da manhã começamos a formar uma fila dos índios (só homens, eles não permitem a saídas das mulheres) e começamos a colocar o povo no interior do ônibus. Tudo pronto para a viagem, saímos em marcha ré de uma rua  apertada e eu fui guiando o motorista. Beleza, quando numa manobra em uma rua paralela, nosso amigo "Pintado" motorista do ônibus alugado para a ocasião, virou a esquerda, e eu do lado direito fui falando, "vem, vem, vem, vem vê o que tu fez, atolou o ônibus. Tinha areia tipo de praia, sabe? Imaginem!
Foi uma correria. Isso às 6:00 da manhã. Às 11:00 estava marcada a primeira gravação do dia com os índios na locação.
Minha colega Débora, pegou uma bicicleta emprestada de um índio que ia para a "roça" trabalhar, e seguiu estrada afora, não sei exatamente atrás do que. Acho que de um trator para "puxar" o buzú.
Pintado e eu, começamos a cavar um buraco na frente dos pneus traseiros do ônibus para colocarmos pedras e tentar desatolar o bicho. Primeira tentativa, e nada, afundou mais! segunda tentativa e nada, afundou mais um pouco. Daí, eu olhei para o lado e os 50 índios estavam de braços cruzados em uma fileira olhando para Pintado e eu nos acabarmos para desatolar o ônibus. Ah, não prestou não! eu dei um grito, "rebanho de pesos mortos, vocês estão ganhando 50,00 cada um para fazer este filme, se nós não chegarmos às 11:00 em Salvador, vocês não vão ver nem a cor desse dinheiro", mas não deu um minuto, e apareceu, porta, pedra, pedaço de pia, saco de cimento. Este foi o pior, saco de cimento. Colocaram tudo dentro do buraco e Pintado deu partida, e eu, comecei a rezar, porque o tanto que já estava atolado, com o cimento ia virar um mar de lama. Mas acho que tinha alguém ouvindo minhas orações. Na primeira arrancada, o bicho não saiu do lugar, na segunda ele deu um pulo em cima da porta e do saco de cimento e se mandou!
O povo entrou no buzú e seguimos pela estrada. Agora a preocupação, onde encontrar Débora. Com alguns minutos, tipo 20 minutos de estrada, subindo uma serra que não tinha mais tamanho, avistamos uma mancha vermelha de longe, era a camisa de nossa colega. Chegando mais perto avistamos ela com um palmo de língua do lado de fora. Pintado abriu a porta do ônibus e eu chamei: Débora!, Débora!,  ela não olhou, chamei de novo, daí ela olhou e continuou a pedalar achando que era uma miragem. Eu disse: ô mulher, acorda, somos nós! ela quase morta, parou, olhou o ônibus todo, e perguntou: como? quando? porque? toda desorientada. Colocamos a bicicleta no bagageiro, e seguimos.
O celular não pegava de forma alguma. Tentamos avisar que estávamos chegando. Já eram 10:00, não chegaríamos a tempo de gravar a primeira cena. Lá por volta das 10:30, já em Feira de Santana, conseguimos um sinal (naquele tempo era dose falar em celular) e falamos com Elson, e ele disse que estava caindo um toró em Salvador e que as gravações tinham sido suspensas.
Pois então, chegando em Salvador com estes 50 índios no Hotel Pirâmide, no viaduto da Rodoviária, ao descer do ônibus, todos os índios de cocares e toda a indumentária, causou um engarrafamento no viaduto, todo mundo querendo parar para fotografar, até uma batida teve, pequena, mas teve.

Conduzi a turminha para o lobby do hotel e como durante a viagem, todos, num ritual de proteção ou alguma coisa parecida, passaram alho e fumo no corpo todo, imaginem o cheirinho bom que o lobby do hotel ficou!
Meu carro estava estacionado na frente do hotel, e como eu sabia que a grana de cinema não sai no mesmo dia, eu ia embora, e depois recebia o pagamento. Foi aí que o chefe (Elson) perguntou a minha colega como tinha sido a viagem. Ela falou a verdade pra ele, que o ônibus havia atolado e ela tinha seguido para buscar um trator e deixou os figurantes no ônibus. Ela teve a melhor das intenções, mas para quem faz cinema e especialmente produção de elenco, sabe que não se deixa figuração e ou elenco sozinho sem produtor (já que eu não era produtor e não tinha experiência nesse assunto), em hipótese alguma.
Daí, ele me chamou e me perguntou o que houve, eu disse que não foi nada, que nós atolamos, e desatolamos o ônibus, e estava tudo bem. Em momento algum entreguei minha colega, primeiro porque não entendia nada de produção, e não sabia que ela não podia se afastar dos figurantes. Elson está vivo e forte para confirmar isso. Ele então pegou um pacote de dinheiro, colocou no meu bolso, e disse: a partir de agora você assume a responsabilidade sobre os índios. Dê café, almoço e janta e cuide para que eles descansem e fiquem todos juntos, para na hora que o diretor chamar para gravar, todos estejam prontos.
Foi aí que tudo começou...
...depois eu conto outro "causo".




Artigo - Pra que Copa?

Eu adoro Copa do Mundo! nos juntamos em um bar, ou em casa de amigos para ver num telão todos os jogos da Seleção. Choramos, rimos, nos abraçamos, é maravilhoso! Mas essa copa de 2014, vai ser uma copa atípica. Ela vai ser aqui em nosso país. Pouco são aqueles que conseguiram ou vão conseguir comprar seus ingressos a 500,00, 1.000,00, ou até 4.000,00 (na mão de cambistas). A grande maioria da população vai ainda assistir pelas tv's, Brasil a fora. Poderia continuar sendo assim. Uma pequena minoria abastada, compraria seus ingressos e pagariam excursões para o país que sediasse a copa e ficaria tudo bem. Mas, ao contrário disso, temos que ouvir Joseph Blatter dizer: vocês não reivindicaram a copa, agora assumam. Ou Ronaldo Fenômeno dizer, que quando ele fez no passado a seguinte declaração "A copa não se faz com hospitais" era outro tempo e que hoje a coisa mudou. Mudou pra quem Ronaldo? para as pessoas que estão vendo o dinheiro da saúde, da educação, do transporte, sendo retirado dos seus bolsos e colocado em obras superfaturadas de estádios, que pagam 10% de comissão para financiar campanhas eleitorais e enriquecer ilicitamente uma meia dúzia de políticos? é isso que o povo está vendo. Meu pedido é que a Rede Globo de televisão em solidariedade ao povo brasileiro, favoreça-nos com a ausência de Ronaldo "O FENÔMENO" nos comentários da Copa das Confederações, porque ele esqueceu que um dia já foi pobre e hoje menospreza a situação do país em detrimento da manipulação que a FIFA exerce sobre os países subdesenvolvidos a exemplo do Brasil. Me orgulho de ser brasileiro no momento em que mais de 1.000.000 de pessoas vão as ruas reivindicar os seus direitos, mais me envergonho de ser brasileiro, quando vejo o discurso da "presidenta", a retórica de Ronaldo "O Fenômeno" e a empáfia de Joseph Blatter, arrotando a sua hipocrisia nas caras sofridas do povo Brasileiro.

Ari Rodrigues, 

cidadão itabunense





Artigo- Minhas lembranças com o amigo Ramon Vane
Em um dia de verão do ano de 1985, saindo de um ensaio de uma peça de teatro de rua, estavam Betão, Alba Cristina, Eva Lima, Ramon Vane e eu de intruso, porque estava começando a namorar com Eva (pra quem não sabe,nós fomos casados).
Nessa época, artista tinha que contar as moedas para tomar cervejas. Eu tinha 20 anos e também era assalariado ou seja, duro também.
Saindo da Sala Zélia Lessa, seguimos pela Cinquentenário e eles resolveram passar no antigo Caçuá (hoje não existe mais, deu lugar a praça Camaçã) para tomar uma rodada de chops que era o que o dinheiro dava.
Sentamos na pizzaria e as mesas na época eram de cimento, tipo um tampão redondo. Estava tendo um sambão de um grupo super conhecido na cidade (não vou divulgar os nomes porque não estou autorizado). Eram nossos amigos, e conhecidos
das baladas. O sambão estava muito bom, o bar cheio e de repente... Ramon sobe numa mesa e começa a recitar um poema. O som do sambão estava muito alto e as pessoas não ouviam o que ele dizia e também estavam querendo ouvir a música.
Ele insistiu e começou a recitar mais alto, quando viu que ninguém prestava a atenção, proferiu para o pessoal do sambão: Respeitem o artista rebanho de @#$%¨&. Não sei como, com aquela barulheira toda, os caras ouviram o palavrão.
Nossa! não sei em que instante esses caras (uns dez) largaram os tambores e pularam pra cima de Ramon! Ele Por sua vez, pulou da mesa sentido Caixa Econômica e correu desesperado. Os caras correram sentido contrário, sentido banco do Nordeste para pegá-lo do outro lado. Eu na época, tinha 85 quilos e era grosso que nem uma porta. Na realidade, o pessoal do teatro não gostava muito de mim, porque eu era considerado almofadinha, mas era namorado de Eva então eles me engoliam, só que eu dava um boi para não entrar numa briga e... Resultado, saí correndo igual um maluco pelo lado que Ramon correu e consegui chegar na frente dele. Tomei a frente e coloquei ele atrás e fiz barreira. Com a mão
estendida, falei que ninguém encostava nele.Os caras em número de 8 a dez, não lembro bem, se olharam e iam partir pra cima, Ramon e eu íamos apanhar mais que mala velha. A salvação foi (esse eu falo o nome porque é meu amigo pessoal) Reinaldinho
do Bradesco, gritou: Parem, Ari é gente minha, deixa isso pra lá. Os outros não gostaram muito, mas, voltaram para o bar. Nisso, foram chegando o resto do pessoal e me agradeceram e foi aí que nasceu o apelido, Ari Facão de ouro que o safado do
Betão colocou que até hoje em Salvador, a galera me chama assim!


Ari Rodrigues
15 de Janeiro de 2017



          ARTIGO           
   Quando o Poder cega

Quando eu trabalhava em produções de cinema na capital há dez anos, uma coisa que me irritava profundamente era o uso dos rádios comunicadores indevidamente e a postura que algumas pessoas passavam a ter quando recebiam o rádio. Era visível a prepotência e a arrogância com que as pessoas passavam a tratar os colegas. Uma frase que eu nunca esqueci, proferida por uma colega de trabalho foi a seguinte: Quer conhecer uma pessoa, dê um crachá e um rádio pra ela e espera a nova personalidade aparecer.
Fazendo um paralelo entre o rádio comunicador e o poder adquirido na súbita ilusão de que cargos políticos são eternos, me lembrei disso quando presenciei a agressão de uma pessoa a uma colega numa rede social. Pode passar mil anos, mas você não conhece realmente as pessoas com quem você convive. Uma grosseria descabida e sem limites por causa de uma simples interpretação, fez com que amizades se desfizessem como açúcar na água. Aí vem a pergunta; vale realmente a pena perder amizades por causa de um ‘‘poder’’ passageiro? cargos de confiança em gestões trazem uma síndrome de humilhar por humilhar sem precedentes. Foi assim que vi a tentativa de uma pessoa com outra numa rede social. Pior ainda, de um homem a uma mulher, um agravante reforçado com uma pitada de covardia. Não admito que ofensas gratuitas sejam feitas contra qualquer pessoa na minha frente, pior ainda se a pessoa for da minha mais alta estima e consideração. Relato esse fato, sem citar os artistas envolvidos por achar que só as próprias pessoas são as interessadas e por não ter a intenção de denegri a imagem de ninguém. Me senti muito mau com o acontecido, mas minha posição não teria que ser outra, senão cortar relações com o agressor e me solidarizar com a pessoa agredida. As pessoas não tem noção da força da palavra, uma vez lançada ao vento, ela pode ter consequências terríveis.
Que esse fato me sirva de exemplo também,  pois, se algum dia chegar ao poder e tiver uma atitude vil como essa, vou procurar me penitenciar porque paguei com a língua e provei do meu próprio veneno.

Ari Rodrigues
Produtor Cultural
Diretor da Acate Itabuna
Ocupa a cadeira de número 36 da AGRAL





Frase:
"As mudanças são necessárias sempre, mesmo que à revelia dos sentimentos"
Ari Rodrigues




SOLAMENTE SOL

Eu não saberia falar,

Expressar,

Pensar, sem antes proclamar

As maravilhas da natureza.

Se ao menos eu tivesse a chance

De um recomeço,

Eu certamente diria:

Eu não mereço,

Que um dia,

Por maior que fosse,

A letargia,

Eu me prostasse  diante do sol

Enebriado de energia,

Falando, suplicando,

Implorando

Que ele nunca se apague,

Mesmo que o inferno congele,

Que ele nunca se apague,

Nunca me apague,

Me afague,

Se afogue nas suas próprias lágrimas.

Ari Rodrigues
6 de Julho de 2007









Artigo postado no Facebook no dia 5 de Fevereiro de 2021

Cerveja indigesta


Crônica postada originalmente no Facebook no dia 8 de Fevereiro de 2021
 
 
CRÕNICA
 
O PESO DOS MEUS 30 ANOS
Sabe quando você descobre o peso da idade nos seus ombros? Pois é, eu descobri num final de tarde do dia 5 de Julho no ano de 1991.
Pedi pra sair do trabalho mais cedo, porque era dia do meu aniversário e eu marquei de comemorar com amigos e com Eva Lima que era minha esposa na época. Morávamos na URBIS IV e eu tinha um Fiat 147 que eu colocava quatro litros de álcool e um de gasolina para rodar, sendo que ele era só a gasolina. Quando ele esfriava, só pegava no tombo. Para evitar vexame de empurrar, eu deixava numa lombada na porta dos fundos da casa dos meus vizinhos Afranio e Railda (hoje é a borracharia de Batatinha). Muito bem. Cheguei em casa, banho, barba feita, vesti a domingueira e saí com uma sacola de presentes que havia ganhado mais cedo. Fechei a porta de casa e saí mais perfumado que penteadeira de mulher dama. Sapato brilhando mais que catarro na parede. Calça branca com uma camisa estampada por dentro com o cinto combinando com o sapato. Estava me sentindo o próprio Brad Pitt. Fechei o portão, cumprimentei uma vizinha que estava na porta e dobrei a esquina. Quando olho a frente, tinha um grupinho de umas quatro meninas com idade entre aparente entre 16 e 18 anos. Vim para o meio da rua pois elas estavam sentadas ocupando toda a calçada. Fui passando e pensando: vou arrasar com essas gatinhas. Passei por elas devagar, cabisbaixo, segurando a chave do carro numa mão e a sacola com os presentes na outra. Quando passo uns dois metros delas, ouço uma dizer: Êta... Pensei comigo: Vai dizer que tô lindo! Ela completou a frase: ... me amarro num "Coroa" desses! Pense numa pessoa que quase cai. Tomei uma topada, quase arranco o solado do sapato. A vista escureceu, quase volto pra casa deprimido. Coroa? no auge dos meus trinta anos? Entrei correndo no carro, O FDP não pegou, ainda tive que passar na frente das ditas cujas dando tranco pra ele pegar.
Descobri ali que os anos passam tão rápido e a gente nem percebe porque geralmente estamos nos dedicando a coisas pequenas como discutir política ou religião. Por isso, hoje, aproveito cada minuto do meu tempo procurando fazer, pensar coisas boas e emanar energias positivas. Sigo com os meus 54 anos bem vividos e querendo chegar aos 100, pois longevidade meu DNA tem pra isso!
POEMA  - AMANHECEU!




CRÔNICA
Zólhos nos olhos!

Morei em Salvador uns doze anos. Lá me virava com tudo, de corretor de carro a motorista de frete em São Joaquim. Mas o que eu mais gostava era vender cerveja em festa de lardo. Não perdia uma! Lavagem de Itapuã, Festa de Yemanjá no Rio Vermelho, Lavagem da 8 de Dezembro e... Lavagem do Bonfim. Essa eu ganhava dinheiro como a zorra!
Certa feita, lá pelos idos de 2002, eu resolvi que não ia vender na Lavagem do Bonfim, ia aproveitar a festa. Peguei a dona da pensão (na época era casado com Eva) e fomos curtir a festa.
Deixei o carro na Ladeira da Água Brusca e desci para a frente do Mercado do peixe onde encontrei um colega vendendo latinhas. Era por volta das 11h. Começamos ali nossos trabalhos. Latinhas e espetinhos. Perto do meio dia, seguimos o trajeto em direção a Colina Sagrada. Chegando na frente de São Joaquim, no passeio da Cesta do Povo, encontramos outro amigo vendendo cervejas, aí já viu, mais latinhas. Seguimos em frente. Quando chegamos na altura da Leste, a mulher disse: Tô apertada! Aí eu olhei para um lado e para o outro no meio da multidão e enxerguei de longe sanitários químicos. Duas filas, uma para homens e outra para mulheres. Entramos um em cada uma e ficamos lá. Não tinha jeito, era encarar mesmo. Com uns quinze minutos de fila, andando bem devagar, sob um sol escaldante, minha paciência já no limite, virei para o lado esquerdo e comecei a reclamar com um cara que estava na fila também. Isso é um absurdo! Poucos sanitários no trajeto! A gente fica numa fila dessas... Estava virado para a esquerda e ouvi a voz de Eva no lado direito dizendo: Aqui você não entra! Olhei rápido e tô vendo uma mulher enorme, batendo boca com Eva. Vou entrar sim e quero ver quem vai me impedir! Eva: Ari, venha ver uma coisa aqui! Me aproximei e perguntei: o que foi? Eva: essa mulher quer passar na minha frente! A mulher: Vou passar sim, porque? Eu: Passe então pra você ver o que acontece! A mulher; é? Peraí que vou chamar Tonhão! Eu disse: Vá chamar a misera do seu Tonhão! Virei de lado e comecei a resmungar! Vá chamar sua porra! Vou dar de chute na cara! Quero ver quem vai passar na frente aqui. Nisso, uma mão da dois tapinhas no meu ombro e pergunta: Qual é o caso aí! Eu pensei rápido, fração de segundos: vou virar ligeiro, olho nos olhos e dou um grito que aí espanto o cabra. Isso eu fiz. Virei ligeiro e... não achei os olhos do cabra. Dei de testa com o peitoral do cidadão. Não obrei na calça  porque não tinha dejetos prontos. Tonhão era um cabo Verde com quase dois metros de altura, faixa de uns 55 anos, com as mãos que pareciam duas pás. Pensei mais rápido do que da primeira vez. Se eu baixar a voz, ele toma conta. Se eu der logo um murro, não vai fazer efeito e ele vai me dar uma raquetada e eu vou direto para o Campo Santo. Aí, achei coragem não sei de onde e dei um grito: O que é que você quer? Hein sua mizera? Tonhão se aputou! senti no tom de voz.  Aí, ele disse sem gritar: Eu tô aqui pra defender minha mulher! Aí eu aproveitei a deixa dele e disse: e eu pra proteger a minha! Silêncio no mundo! Fiquei em pé ao lado de Eva, esqueci até do meu lugar na outra fila. Ele ficou em pé ao lado da mulher dele e a misera dizendo: Você vai deixar por isso mesmo? Vai engolir desaforo desse gordo? Aquela loira me ofendeu! Tonhão quieto e eu pensando: essa misera fica atiçando o cabra! 
Eva entrou no sanitário e eu me afastei apertando as pernas para a urina não descer e fui pra fila conversar com o cabra que eu estava conversando antes. O cara me falou baixo: você sabe quem é esse? Eu disse, baixinho: não! Ele disse é Tonhão estivador do moinho. O cara mais caceteiro de Água de Meninos. Nisso, Eva saiu do sanitário, peguei na mão dela e saí apressado sem olhar pra trás. Ela dizendo: O que foi? Que carreira é essa? E eu: Anda mizera, o número dois tá na porta!

Ari Rodrigues
Postada no facebook
Dia 26 de Abril de 2021


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