O painel com mãos de diversos artistas, foi pintado com a cor que representa bem o que vive a cultura de Itabuna
José Datrino (1917-1996), conhecido como
o Profeta Gentileza, personagem da vida urbana carioca, se popularizou fazendo inscrições
debaixo do viaduto, na Avenida Brasil, RJ, onde escrevia mensagens sobre paz, amor
e, claro, gentileza.
Após a morte do Profeta, a prefeitura do
Rio de Janeiro começou a apagar as mensagens escritas por ele. Alguns artistas
se mobilizaram e a cantora Marisa Monte interpretou uma canção (“Gentileza”)
que homenageava o Profeta e também denunciava a destruição das mensagens
escritas por ele: “Nós que passamos apressados / Pelas ruas da cidade / Merecemos
ler as letras e as palavras de gentileza... Apagaram tudo / Pintaram tudo de
cinza / Só ficou no muro / Tristeza e tinta fresca.”
Lembrei-me desse episódio porque em
Itabuna, BA, dentro do Centro de Cultura Adonias Filho – CCAF – (que, há mais
de um ano, permanece semi-destruído, justamente quando comemoramos o centenário
desse nosso grande autor grapiúna) a história se repete, ou melhor: havia dentro
do CCAF, um mural, na “Alameda Jorge Amado”, pintado por diversos artistas, que
homenageava a cidade, as artes e os artistas em geral, ajudando a preservar a
história, a memória e a cultura de várias gerações de talentos grapiúnas que lutaram
e lutam para manter viva a nossa Arte.
E então, adivinhe, prezado(a) leitor(a),
o que fizeram aqueles que estão maquiando o CCAF, diante do referido mural?
Isso mesmo: “apagaram tudo / Pintaram tudo de cinza / Só ficou no muro /
Tristeza e tinta fresca.” Com a diferença que eles não usaram o cinza, mas, o
preto para, suponho, cobrir de trevas as luzes da esperança. Contudo “eles” não
vencerão! Pode não haver apoio oficial à cultura, mas, isso não impede, nem
impedirá que os verdadeiros artistas e os apreciadores culturais, continuem
lutando pela Arte! O portão do CCAF pode estar fechado há mais de um ano, mas,
isso não detém, nem deterão a criatividade e o talento de nossos artistas. E os
ditos “gestores” que querem ver, presumo, a Arte e a Cultura morrerem à míngua,
não perdem por esperar!
O que aconteceu ao Mural é um absurdo,
mas, ainda não é tudo. É preciso que os “responsáveis” pelo CCAF venham à
público, também, para explicar o paradeiro da escultura (doada por Ramiro
Aquino) que ficava à entrada do Adonias Filho. Bem como os destinos das
máscaras que ornamentavam as paredes do Foyer. O Centro Cultural Adonias Filho
é um patrimônio da Região Cacaueira e é triste vê-lo na situação em que se
encontra, a título de uma “reforma” que se arrasta e parece não ter fim.
De desinteresse em desinteresse o tempo
passa e nada é feito. Não há políticas públicas de incentivo cultural que ultrapassem
os limites da mediocridade. Fazer óbvio já ajudaria muito. Mesmo assim os
“gestores” nada fazem! É preciso uma ação cultural inteligente, impactante,
atuante e contínua. A “reforma” do CCAF é de uma lentidão angustiante e quase interrompeu
as atividades artísticas de Itabuna e Região. Aliás, essas atividades só não
pararam completamente porque a dedicação e o amor dos nossos artistas mantêm a
chama da esperança acessa.
Durante quase dez anos o grande
artista Aldo Bastos esteve à frente da Administração do CCAF e foi muito por
causa da dedicação dele que o CCAF se manteve e se revigorou. Aldo comprometeu-se
com a cultura, com os artistas e com a Arte. Fez acontecer! Muitos são aqueles que
reconhecem a administração de Aldo Bastos como muito antenada com a cultura e
também com a infra-estrutura do CCAF. Aldo Bastos deixou sua marca frente à
administração do Adonias Filho. Mas apesar de toda a sua grande e respeitada
trajetória artística e de seu empenho à frente do CCAF, nada disso foi levado
em conta pelos tecnocratas da cultura que, sem nenhum sentimento ou
envolvimento, simplesmente, apagaram tudo com as tintas do descaso.
Pois é, tudo isso está acontecendo. Mas
onde está a nossa sociedade civil organizada? Como se posicionam, por exemplo,
Maçonaria, Rotary, Lions, CDL, IPC (Instituto Pensar Cacau), Alita (Academia de
Letras de Itabuna) e Agral (Academia Grapiúna de Letras)?
De maneira efetiva tenho visto as ações heróicas
de Mateus Saron, diretor teatral, à frente de seu esplêndido “Palco Grapiúna”; Gustavo
Felicíssimo escritor e editor, publicando grandes nomes da literatura através
da Editora Mondrongo; Raquel Rocha, cineasta e articuladora cultural, em seu
programa da TV Itabuna; Ari Rodrigues, diretor da ACATE (Associação Cultural
amigos do Teatro), organizador de uma petição pública em favor do Centro de
Convenções, do Teatro e do CCAF e Andirlei Nascimento Silva, presidente da OAB,
subseção Itabuna, que apóia aquela referida petição.
Enfim... Talvez,
agora, parodiando um trecho da canção de Caetano Veloso (“Língua”), melhor
seria cantar: ... e deixe os Portugais morrerem à míngua / “Minha pátria é
minha língua” / Fala Itabuna! Fala!
Cláudio Zumaeta - Historiador
graduado pela Universidade Estadual de Santa Cruz (UESC, Ilhéus – BA) Administrador de Empresas graduado pela
Universidade Católica de Salvador (UCSAL, Salvador – BA). Especialista em
História do Brasil (UESC, Ilhéus – BA). Membro da Academia Grapiúna de Letras
(AGRAL).
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