26 de jun. de 2015

ARTIGO DE CLÁUDIO ZUMAETA - Apagaram tudo!

O painel com mãos de diversos artistas, foi pintado com a cor que representa bem o que vive a cultura de Itabuna

José Datrino (1917-1996), conhecido como o Profeta Gentileza, personagem da vida urbana carioca, se popularizou fazendo inscrições debaixo do viaduto, na Avenida Brasil, RJ, onde escrevia mensagens sobre paz, amor e, claro, gentileza.
Após a morte do Profeta, a prefeitura do Rio de Janeiro começou a apagar as mensagens escritas por ele. Alguns artistas se mobilizaram e a cantora Marisa Monte interpretou uma canção (“Gentileza”) que homenageava o Profeta e também denunciava a destruição das mensagens escritas por ele: “Nós que passamos apressados / Pelas ruas da cidade / Merecemos ler as letras e as palavras de gentileza... Apagaram tudo / Pintaram tudo de cinza / Só ficou no muro / Tristeza e tinta fresca.”
Lembrei-me desse episódio porque em Itabuna, BA, dentro do Centro de Cultura Adonias Filho – CCAF – (que, há mais de um ano, permanece semi-destruído, justamente quando comemoramos o centenário desse nosso grande autor grapiúna) a história se repete, ou melhor: havia dentro do CCAF, um mural, na “Alameda Jorge Amado”, pintado por diversos artistas, que homenageava a cidade, as artes e os artistas em geral, ajudando a preservar a história, a memória e a cultura de várias gerações de talentos grapiúnas que lutaram e lutam para manter viva a nossa Arte.
E então, adivinhe, prezado(a) leitor(a), o que fizeram aqueles que estão maquiando o CCAF, diante do referido mural? Isso mesmo: “apagaram tudo / Pintaram tudo de cinza / Só ficou no muro / Tristeza e tinta fresca.” Com a diferença que eles não usaram o cinza, mas, o preto para, suponho, cobrir de trevas as luzes da esperança. Contudo “eles” não vencerão! Pode não haver apoio oficial à cultura, mas, isso não impede, nem impedirá que os verdadeiros artistas e os apreciadores culturais, continuem lutando pela Arte! O portão do CCAF pode estar fechado há mais de um ano, mas, isso não detém, nem deterão a criatividade e o talento de nossos artistas. E os ditos “gestores” que querem ver, presumo, a Arte e a Cultura morrerem à míngua, não perdem por esperar! 
O que aconteceu ao Mural é um absurdo, mas, ainda não é tudo. É preciso que os “responsáveis” pelo CCAF venham à público, também, para explicar o paradeiro da escultura (doada por Ramiro Aquino) que ficava à entrada do Adonias Filho. Bem como os destinos das máscaras que ornamentavam as paredes do Foyer. O Centro Cultural Adonias Filho é um patrimônio da Região Cacaueira e é triste vê-lo na situação em que se encontra, a título de uma “reforma” que se arrasta e parece não ter fim.
De desinteresse em desinteresse o tempo passa e nada é feito. Não há políticas públicas de incentivo cultural que ultrapassem os limites da mediocridade. Fazer óbvio já ajudaria muito. Mesmo assim os “gestores” nada fazem! É preciso uma ação cultural inteligente, impactante, atuante e contínua. A “reforma” do CCAF é de uma lentidão angustiante e quase interrompeu as atividades artísticas de Itabuna e Região. Aliás, essas atividades só não pararam completamente porque a dedicação e o amor dos nossos artistas mantêm a chama da esperança acessa.
            Durante quase dez anos o grande artista Aldo Bastos esteve à frente da Administração do CCAF e foi muito por causa da dedicação dele que o CCAF se manteve e se revigorou. Aldo comprometeu-se com a cultura, com os artistas e com a Arte. Fez acontecer! Muitos são aqueles que reconhecem a administração de Aldo Bastos como muito antenada com a cultura e também com a infra-estrutura do CCAF. Aldo Bastos deixou sua marca frente à administração do Adonias Filho. Mas apesar de toda a sua grande e respeitada trajetória artística e de seu empenho à frente do CCAF, nada disso foi levado em conta pelos tecnocratas da cultura que, sem nenhum sentimento ou envolvimento, simplesmente, apagaram tudo com as tintas do descaso.
Pois é, tudo isso está acontecendo. Mas onde está a nossa sociedade civil organizada? Como se posicionam, por exemplo, Maçonaria, Rotary, Lions, CDL, IPC (Instituto Pensar Cacau), Alita (Academia de Letras de Itabuna) e Agral (Academia Grapiúna de Letras)?
De maneira efetiva tenho visto as ações heróicas de Mateus Saron, diretor teatral, à frente de seu esplêndido “Palco Grapiúna”; Gustavo Felicíssimo escritor e editor, publicando grandes nomes da literatura através da Editora Mondrongo; Raquel Rocha, cineasta e articuladora cultural, em seu programa da TV Itabuna; Ari Rodrigues, diretor da ACATE (Associação Cultural amigos do Teatro), organizador de uma petição pública em favor do Centro de Convenções, do Teatro e do CCAF e Andirlei Nascimento Silva, presidente da OAB, subseção Itabuna, que apóia aquela referida petição.   
Enfim... Talvez, agora, parodiando um trecho da canção de Caetano Veloso (“Língua”), melhor seria cantar: ... e deixe os Portugais morrerem à míngua / “Minha pátria é minha língua” / Fala Itabuna! Fala!
Cláudio Zumaeta - Historiador graduado pela Universidade Estadual de Santa Cruz (UESC, Ilhéus – BA)  Administrador de Empresas graduado pela Universidade Católica de Salvador (UCSAL, Salvador – BA). Especialista em História do Brasil (UESC, Ilhéus – BA). Membro da Academia Grapiúna de Letras (AGRAL).

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